Os entraves jurídicos na regulação do ensino superior do Brasil foi tema da conferência de abertura do primeiro módulo do Programa para o Desenvolvimento de Empresários e Executivos do setor de Educação – PRODEESE. Realizado nos dias 14 e 15 de março, o evento teve como eixo Regulação e Avaliação.
A conferência foi ministrada pelo advogado tributarista e doutor em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, Filipe Piazzi, e pelo CEO da Hoper e doutor em educação, Adriano Coelho.
Em um diálogo com Coelho, o advogado trouxe vários cases que boa parte das IES vivenciam no dia a dia. Um dos destaques foram dificuldades enfrentadas por algumas instituições para abertura de cursos de medicina e realização de vestibular.
Piazzi trouxe exemplos relativos às portarias MEC de calendários regulatórios. Em razão da dificuldade de prazo e inseguranças jurídicas, algumas instituições têm ajuizado mandado de segurança para que seja cedida a possibilidade jurídica de abertura dos cursos de medicina.
Para Coelho, é importante o posicionamento dos gestores diante das dificuldades judiciais encontradas, seja em qualquer setor da IES. Em relação aos cursos de medicina, Dr. Piazzi lembra que um caminho possível é seguir em frente com recursos para garantir a realização dos vestibulares e viabilização dos cursos.
Para todas as situações envolvendo questões jurídicas, Coelho lembra que é importante estar atento aos movimentos regulatórios e judiciais. “A regulação continua sendo alicerce, mas é preciso ir além do processo regulatório”, salienta.
ENADE
Outro case do painel foi a não participação do aluno no Enade como impedimento para colação de grau. Sobre esse assunto, Piazzi diz que as decisões judiciais pregressas mostram que o Enade avalia a instituição e não o aluno. Portanto, o aluno tem direito de não participar da colação, o que acaba por prejudicar a avaliação da IES e a geração de indicadores para o País.
“Os tribunais regionais têm dado decisões favoráveis aos alunos, mas o Superior Tribunal de Justiça – STJ, não. Então há conflito de decisão e até o processo chegar no STJ o aluno colou grau e aplica-se a teoria do fato consumado”, explica.
Colação de grau simbólica
Existe colação de grau simbólica? Piazzi explica que na colação de grau é preciso separar a celebração. A banca, a festa não é ato, frisa. “A cerimônia tem efeito simbólico e não jurídico”, diz. Segundo o advogado, a justiça tem entendido que há um elemento de celebração sem um ponto legal.
Conforme portaria do MEC N. 1.095/2018, a colação de grau é requisito obrigatório para expedição do diploma em no máximo 60 dias. Neste caso, é recomendado a IES fazer um recorte no regimento, ou seja, estabelecer limite temporal de 6 meses a 1 ano para permitir a colação simbólica, além de coletar assinatura do aluno em termos de ciência relativa à colação de grau simbólica e sem efeitos jurídicos.
Nota Técnica N. 140/2023/CGSE/DISUP/SERES
A Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (SERES/MEC) emitiu no dia 16 de janeiro deste ano a Nota Técnica n.º 140/2023 que propõe a instauração de procedimentos preparatórios de supervisão perante instituições de ensino superior que apresentam razão aluno-docente desproporcional nos cursos à distância (EaD). O que não é previsto na legislação.
Piazzi explica que a nota é resultado do Censo da Educação Superior de 2022 que apontou crescente assimetria na razão aluno-professor. A afirmação tem como base o fato de as matrículas aumentarem a cada ano enquanto cai o número de professores. Em alguns casos, há 500 alunos por professor.
O advogado diz que a nota técnica não tem caráter normativo, apenas propositivo. Ela está orientando e não dizendo que deverá ser daquele jeito. Ele ainda diz que a nota técnica deve ser vista como um alerta de que a razão aluno-professor comporá os critérios avaliativos no futuro.
Ele ainda coloca que padrões numéricos não vinculam, necessariamente, a qualidade de uma IES que deverá ser aferida por múltiplos critérios. Além de não existir na legislação indicador que faça a exigência da razão de aluno-docente.
Encerramento voluntário da IES/curso
Em situações dessa natureza, Piazzi diz que a comunicação é a chave.
“Há necessidade de uma atuação muito mais preventiva do que contenciosa”.
É importante evitar o efeito surpresa, portanto, é preciso atuar com ferramentas de comunicação, ou seja, reuniões e divulgação por meios oficiais (portal do aluno, comunicados impressos, utilização mural físico, e-mail, WhatsApp, redes sociais, entre outras).
Outros procedimentos que podem ser adotados são: elaboração de Termo de Convênio com a IES “acolhedora”, rescisão humanizada dos contratos de trabalho; encerramento de contratos públicos e privados.
Mudança de grade com curso em andamento
Em relação às eventuais mudanças nas grades de cursos em andamento, há, conforme Piazzi uma jurisprudência, com base na Nota Técnica 793/2015.
“O aluno não tem direito adquirido a currículo acadêmico de curso de ensino superior, submetendo-se às condições e adaptações ditadas pela escola (...)”
Apesar da jurisprudência, enquanto critério de segurança é preciso que a mudança seja comunicada de modo claro aos alunos com antecedência mínima de um mês e que seja feita a conclusão dos atos perante os órgãos reguladores.
A mudança da grade ainda deve incidir período letivo seguinte sem haver prejuízo financeiro e/ou temporal.
Outros temas
Outros assuntos discutidos na conferência foram à integralização curricular antecipada, apuração de falta grave cometida por estudantes e demissão de professor fora do período convencional.
No primeiro caso, quanto à integralização curricular, é preciso atenção Parecer CNE/CES N. 8/2007 e a Resolução do MEC N. 2 de 18.06.2007. Quanto à apuração de falta grave de estudantes, o advogado elenca uma série de medidas imprescindíveis:
Previsão regimental clara quanto à gradação das faltas (leve, média ou grave) e penalidade respectiva;
Previsão de procedimento de apuração e deliberação (conselho competente, forma de intimação, prazos, hipótese de suspensão de frequentar as aulas sem prejuízo acadêmico);
Gestão da informação (interna e externa) e gestão de crise.
Já a demissão do professor fora do período do convencional a recomendação:
1 dia antes das férias escolares do 1º semestre/1 dia antes do início do recesso escolar no 2º semestre.
Quando o aviso prévio for indenizado ou 30 dias antes do início das férias quando o aviso for cumprido.
Denise Paro
Jornalista
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