Desde que foi criado, em 1999, pelo Ministério da Educação durante o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que tinha na época como Ministro da Educação Paulo Renato de Souza, o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior - FIES, nunca foi tratado com tanto descaso. Sem mudanças nas regras atuais, o programa não volta a beneficiar os estudantes que mais precisam dele.
Criado para atender prioritariamente estudantes de baixa renda, financiando suas mensalidades no ensino superior privado, o FIES passou a ser a solução para aqueles brasileiros que sonhavam em mudar de vida conquistando a formação superior.
Por outro lado, para as instituições de Ensino Superior privado, o FIES representou uma importante forma de captação de matrículas alcançando o público baixa renda, até então excluídos por falta de condições para arcar com o pagamento das mensalidades.
Tanto é verdade que durante os “anos dourados” do FIES, entre 2013 e 2016, algumas IES chegaram ao patamar de 60% e de até 70% de ingressantes por meio do programa, o que representava, aproximadamente, de 40% a 50% de suas receitas mensais.
Desde a data de sua criação e até agora, nestes 24 anos o FIES teve algumas alterações, ora positivas, ora negativas, tanto para os alunos como para as Instituições de Ensino.
Histórico de mudanças no FIES
Em 2010, durante o segundo mandato do Presidente Luiz Inácio, as taxas de juros anuais caíram de 6,5% para 3,4%, E com carência de 18 meses após a conclusão do curso para início da quitação do financiamento. Ainda, o prazo de quitação passou a ser de até três vezes o tempo de duração do curso objeto do financiamento.
Em 2015, no Governo Dilma Rousseff, foram implementadas mudanças nos critérios de concessão do financiamento, limitando o índice de reajuste anual do valor das mensalidades e exigindo que o aluno tirasse um mínimo de 450 pontos nas provas objetivas e que não zerasse a redação do Enem - Exame Nacional do Ensino Médio.
Em 2018, no Governo Michel Temer, foi instituído o Novo Fies, que trouxe grandes mudanças. Por um lado, as regras melhoram a forma de acesso para os estudantes, e uma parte dos financiamentos passou a ser feita com juro zero. Mas, por outro lado, as taxas de juros cobradas para o financiamento e a exigência de fiador deixarem de ser atrativas. Veja como ficou:
Modalidade Fies I: Oferta de vagas a juro zero destinadas aos estudantes com renda mensal familiar de até três salários-mínimos.
Modalidade Fies II: Destinado aos estudantes com renda familiar mensal de até cinco salários-mínimos das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste com taxas de juros variando de acordo com o banco contratado.
Modalidade Fies III: Também destinado para estudantes com renda familiar mensal de até cinco salários-mínimos, mas com acesso liberado a todas as regiões do Brasil, e com taxas de juros variando de acordo com o banco.
Já nas regras aplicadas para as Instituições de Ensino, a partir de 2018, as condições do então chamado Novo FIES tornaram o programa cada vez menos atrativo. Com isso, a maior parte das instituições passou a reduzir gradativamente a oferta de vagas destinadas a este formato de Financiamento.
Veja como as regras foram mudando para as Instituições de Ensino
Até 2017 a taxa de retenção como devedor solidário no Fundo era de 6,25%(FGEDUC);
Em 2018 e 2019 a taxa sobe para 13%, agora como FG-Fies;
De 2020 a 2022 a taxa é de no mínimo 10%, podendo chegar até a 25%;
A partir de 2023 não tem mais teto de desconto, chegando em alguns casos a retenções que podem comprometer até 100% do repasse.
Esse cenário previsto no Fies e detalhado na Resolução FNDE n.º 12, de 13 de dezembro de 2017, posteriormente alterada pela Resolução 20, de 30/01/2018, criou uma sistemática que, face às características do Novo Fies, impõe uma onerosidade insustentável às Instituições.
Para além dessa situação, o próprio estudante, diante da escassez de vagas oferecidas no âmbito do programa, bem como a modelagem de coparticipação, entre outras características, por vezes adia a decisão de ingressar numa instituição de educação superior privada.
Para agravar ainda mais a situação financeira das Instituições de Ensino, a Caixa Econômica Federal passou a reter percentuais de repasse dos créditos de direito da IES em patamares crescentes, ficando o percentual de retenção da coparticipação vinculado ao grau de inadimplência dos alunos beneficiárias do FIES junto à Caixa.
A retenção, que até 2017 alcançava 6,25%, chega ao ano de 2023 praticamente sem limite, comprometendo de forma violenta o fluxo de caixa das Instituições, com relatos de mantenedores ou diretores financeiros apontando retenções a níveis insuportáveis, com uma variação de 30% a 80%.
Outro reflexo para redução na captação de alunos nos cursos de graduação presenciais foi o direcionamento da demanda para ingressar em cursos de graduação a distância (EAD), os quais possuem ticket médio inferior e se tornaram mais atrativos e suportados pelo aluno de baixa renda.
Com o novo governo empossado em 2023, há expectativas de uma melhora na forma de oferta e acesso para o aluno mediante uma modificação no FIES, assim como de novas regras de participação das Instituições no programa.
Observando uma análise pela história dos FIES, verifica-se que durante o período de 2010 a 2015 o FIES foi ajustado em suas regras de maneira a se tornar a principal alternativa de fomento público para a matrícula de alunos em cursos presenciais. E, nos compromissos de campanha assumidos pelo então candidato em 2022, e atual presidente em 2023, que Luís Inácio Lula da Silva colocou o FIES entre as prioridades de seu governo.
Os diversos gargalos do Novo Fies, as experiências positivas, as questões que precisam ser revisadas, bem como as decisões judiciais mais recentes, são pontos a serem discutidos com os atuais gestores do FIES para que o programa possa voltar a desempenhar o papel social para o qual foi criado.
Neste sentido, pela ação sugerida pelas entidades representativas da Educação Superior, em 15 de maio de 2023 o FNDE e a Caixa Econômica soltaram uma pesquisa direcionada às Mantenedoras para a coleta de sugestões sobre o que seria uma nova configuração para o FIES.
O objetivo desta iniciativa é o de conhecer as sugestões para melhorias no programa, o que representa um excelente passo para que o setor possa se posicionar e contribuir para estas mudanças. Estas sugestões serão encaminhadas ao GT do Fies instituído pelo atual Governo.
É preciso que o governo reconheça definitivamente a importância da educação como pilar para o desenvolvimento e sustentabilidade econômica, assim como estratégia para o fortalecimento de nossa soberania.
O desejo das Instituições de Ensino Superior é que o FIES seja este agente e passe a ser considerado programa social a exemplo dos subsídios atribuídos e destinados a outros programas sociais, e não como um programa de financiamento gerido por um olhar de agente financeiro, simplesmente.
Finalmente, o setor da educação privada aguarda ansiosamente uma definição adequada desta situação insustentável que as IES foram impactadas. É nítido que, caso não se obtenha uma solução adequada, que o programa FIES estará com seus dias contados, uma vez que nas condições atuais, poucas ou talvez nenhuma IES consiga manter a oferta de vagas para o ingresso de novos alunos por meio do programa.
Quer saber mais sobre o tema? Inscreva-se em nosso webinar gratuito:
Ao vivo em 17 de maio de 2023
Eduardo Soares de Oliveira
Conselheiro da ABMES e Mantenedor do UniHorizontes.
ATENÇÃO: Não é permitida a reprodução integral do conteúdo acima. A reprodução parcial é permitida apenas na forma de citação e com link para o conteúdo na íntegra. Plágio é crime (Lei 9610/98).
Comments