DATA BASE: 16/03/2015
O objetivo deste documento é esclarecer às Instituições de Educação, à Imprensa e demais interessados no mercado educacional, o posicionamento da Hoper Educação mediante as recentes mudanças nas regras do Fundo de Financiamento Estudantil para o Ensino Superior (FIES). Objetiva também gerar uma fonte da Hoper Educação única e confiável sobre o assunto, uma vez que notícias veiculadas pela imprensa referente ao impacto dessas mudanças no mercado educacional brasileiro eventualmente são incompletas e fragmentadas, podendo ser interpretadas erroneamente pelo mercado.
Estratégias de inclusão na Educação Superior e o Financiamento Estudantil
A oferta de financiamento estudantil é um tema importante e presente nos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Há 20 anos o Banco Mundial e a Unesco já sugeriam o financiamento estudantil em suas orientações como uma estratégia fundamental para ampliar o acesso à educação superior. A grande parte das estratégias para acesso à educação superior no mundo estão organizadas em programas de financiamento estudantil com a participação efetiva de investimento de recursos pelo Governo e complementadas pela oferta de financiamento privado, oferecido por empresas especializadas, pelas próprias IES ou por cooperativas de crédito.
FIES no Brasil
Criado em 1999 com o objetivo de substituir o PCE/CREDUC, o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) é um programa do MEC destinado à concessão de financiamento a estudantes regularmente matriculados em cursos superiores não gratuitos e com avaliação positiva nos processos conduzidos pelo governo federal. No início do Programa, as fontes de receita eram provenientes do MEC, Caixa Econômica Federal e do recebimento de resíduos financeiros do antigo CREDUC. Em 2010, o Banco do Brasil juntou-se a este grupo. A expectativa do governo era que ao longo do tempo o FIES se tornasse autossustentável, na medida em que cada estudante concluísse o curso e iniciasse o reembolso do empréstimo. Essa condição mostrou-se insustentável e o governo certamente terá que arcar com o ônus da expansão de crédito e financiamento estudantil. Com a ameaça de crise econômica, inflação, entre outros problemas governamentais, houve retração de investimentos em todas as áreas, inclusive a educacional. O texto que segue visa contextualizar e esclarecer a respeito das últimas mudanças ocorridas com o FIES a partir das Portarias Normativas nº 21 e nº 23, no final de 2014. Também objetiva analisar e avaliar os principais impactos dessas mudanças na educação superior privada.
Portaria Normativa nº 21
No dia 26 de dezembro de 2014, o governo federal estabeleceu, a partir da Portaria Normativa nº 21, novas exigências para os estudantes terem acesso ao FIES. A nova regra determina que os alunos que concluíram o ensino médio a partir de 2010 e que optarem por aderir ao FIES, precisarão atender aos seguintes pré-requisitos para ter direito ao programa de financiamento:
1. Nota mínima no ENEM: ter obtido nota mínima de 450 pontos no ENEM.
2. Redação: ter tirado nota maior que zero na redação do ENEM.
3. PROUNI: o estudante não poderá usufruir dos benefícios do FIES e do PROUNI ao mesmo tempo.
Como referência comparativa para uma avaliação de possível impacto, em 2012 o ENEM contou com a participação de 4.230.840 pessoas. Deste total, 695.816 participantes concluintes do ensino médio após 2010 tiveram notas inferiores a 450 ou zeraram em redação. Isto significa que, em nível nacional, 16,4% dos participantes do ENEM 2012 estariam impossibilitados de solicitar o FIES. O estado com maior percentual de estudantes abrangidos por esta restrição é o Norte, com um número de 94.697 estudantes em um total de 257.436 participantes, representando 22,1% daquela região. Outra região que merece destaque é o Nordeste, com 19,2% dos participantes dessa região.
Perdas de matrículas de alunos
O cálculo exato do impacto das perdas em novas matrículas de alunos com FIES para cada instituição é complexo. Existem múltiplas variáveis que afetam este percentual, tais como:
1. Localização geográfica da IES;
2. Perfil da instituição;
3. Número de candidatos em cada processo seletivo que terminaram o ensino médio antes e após 2010.
Ainda que a análise seja complexa e personalizada, analisando um conjunto de IES de diferentes portes e características é possível estimar o percentual de queda no alunado variando entre 8% a 30%. Nos últimos anos a captação de alunos para os cursos de graduação das IES foi fortemente influenciada pela ampliação dos programas de financiamento, em especial o FIES. Os próximos dois anos serão mais desafiadores para o setor de educação superior privado, com uma provável redução de alunos ingressantes, possível aumento na evasão e provável elevação da competitividade. Será provável e necessária uma reorganização das estratégias de captação de alunos em função das mudanças no FIES e também em função das condições econômicas do Brasil em 2015. Esta última pode ter influência maior no contexto de captação que as mudanças no FIES.
Riscos e oportunidades para pequenas e médias IES e grandes grupos quanto ao FIES
Nos últimos anos a Hoper tem sido consultada por seus clientes e pelo mercado sobre o percentual ideal de alunos matriculados no FIES. A recomendação da Hoper às instituições de educação sempre foi não excederem em 30% a dependência financeira em relação ao FIES. Tal sugestão estaria embasada na percepção de possíveis mudanças iminentes no sistema de financiamento público. Algumas instituições chegaram a atingir patamares acima de 80% de dependência deste programa de financiamento. Em vistas disso, tanto grupos consolidadores quanto faculdades isoladas precisarão buscar alternativas para minimizar essa dependência. Os grandes grupos e IES de porte médio-alto, que possuem recursos para propor um financiamento próprio, podem encontrar nesta solução um dos seus diferenciais competitivos, mitigando os riscos financeiros para os anos de 2015 e 2016 até ajustarem seu fluxo de caixa. Mesmo as IES de pequeno e médio porte que não possuam condições para ter seus próprios programas de financiamento, poderão recorrer a negociações com outros programas de financiamentos privados e apresentar alternativas ao FIES para seus alunos. Descontos nas mensalidades podem ser uma opção para reduzir o impacto das taxas de juros mais altas destes programas alternativos.
Cronograma de recompra de CFT-E
Uma das alterações nas regras do FIES foi a mudança no cronograma de recompra de CFT-E (Certificado Financeiro do Tesouro - Série E), título público federal. Segundo as recentes portarias do governo que alteram as regras do FIES, o cronograma de recompra passará a ser de 8 recompras ao ano. O impacto desta mudança nas IES será variável, conforme o percentual de exposição da instituição ao FIES. As IES com receita líquida proveniente de alunos matriculados com FIES com valores acima de 30% do seu faturamento líquido provavelmente serão afetadas em seu fluxo de caixa, pois a arrecadação financeira da recompra estará vinculada à cobertura das despesas operacionais institucionais. Nos últimos dias surgiram rumores que o Governo retornaria ao cronograma de 12 recompras, contudo, não há nenhuma confirmação até a presente data.
Nível de risco para as Instituições
Das 1.456 IES particulares que utilizam o FIES, apenas 10% estão em situação crítica, ou seja, com mais de 50% de matrículas atreladas ao financiamento. Estas possuem risco alto, e em alguns casos poderão chegar à falência caso não efetuem ajustes drásticos em sua gestão. Os outros 90% das IES particulares estão abaixo dessa situação de risco e poderão utilizar alternativas de realinhamento das estratégias para redução da dependência do financiamento público, tais como: retomada da captação de alunos sem FIES, ajustes nas modalidades de ensino e aprendizagem para reduzir custos e aumentar a qualidade acadêmica.
Novos critérios de alocação de recursos FIES - CPC 5
Mesmo sem uma Portaria específica (quase informalmente) o governo brasileiro divulga os novos critérios de alocação de recursos para o FIES, com base no Conceito Preliminar de Curso (CPC). Os cursos com CPC abaixo de 5 terão restrições no acesso ao financiamento estudantil. Era previsível o governo restringir o FIES para cursos específicos com elevado número de formados e mais obviamente aos cursos com baixa qualidade. Este é mais um dos fatores influenciadores na queda do número de alunos e, consequentemente, na receita de algumas IES. Conforme já mencionado anteriormente algumas IES com alta dependência do FIES e cursos com CPC mais baixo podem perder mais de 30% da receita com as mudanças impostas pelo Governo nos critérios do FIES. Um problema reversível para muitas destas IES se optarem pela reorganização das estratégias de gestão acadêmica e de marketing.
Dificuldades na matrícula dos alunos do FIES
Muitas instituições de educação que utilizam o FIES vêm enfrentando problemas com a matrícula de seus alunos no programa. Em especial no que tange ao reajuste dos valores das mensalidades. A seguir os exemplos de como este problema vem sendo contornado pelas IES:
A IES efetua a matrícula dos alunos (mediante liberação do SisFIES) e caso o reajuste aplicado no valor de mensalidade seja superior aos 6,41% permitidos pelo governo, estão deixando ciente aos alunos que existe uma diferença de valor (frente aos alunos sem financiamento) e que até o final do semestre tentarão ajustar isso com o Governo. Caso não seja possível ajustar com o Governo, a dívida será cobrada do aluno.
Algumas IES já estão repassando a diferença ao aluno, em boletos mensais, divididos ao longo do semestre.
Outras IES oferecem modalidades alternativas de financiamento estudantil (privado ou da própria IES).
Além disso, algumas IES já conseguiram liminares na justiça contra essa nova regra do FIES;
Seja com alunos novos ou antigos, as IES seguem a máxima: é melhor gerir um desconforto junto aos alunos FIES, que moderar problemas com o efetivo de alunos que não têm financiamento, que na larga maioria das IES representam o maior percentual do seu alunado.
Contribuiram para a realização deste documento: Caio Polizel - Coordenador das consultorias da Hoper Educação
Paulo Presse - Coordenador da área de Estudos de Mercado da Hoper Educação
Pedro Mena Gomes - Consultor Financeiro e Analista de Mercado Sênior da Hoper Educação
Romário Davel - Consultor Financeiro e Analista de Mercado Sênior da Hoper Educação
William Klein - CEO da Hoper Educação
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Plágio é crime (Lei 9610/98).